INFANTE: “A música para mim é vida, e eu vou buscar vida à música”
Chama-se Ricardo Infante, mas é por INFANTE que todos conhecem uma das mais recentes revelações do Hip Hop nacional. Cresceu rodeado de música e, com 27 anos, carrega na bagagem uma passagem pelo conservatório e um toque numa licenciatura da área do desporto.
Reportagem de Ana Catarina Correia
Não leva muito tempo de existência em Portugal, mas o pouco que leva está repleto de histórias e de talentos que colecionam views atrás de views nos vídeos que partilham para divulgar a sua mensagem. Falamos do hip hop, o estilo musical que transporta as vivências do dia-a-dia para os ouvidos de quem o consome. No panorama nacional encontra as suas origens na Margem Sul e nas comunidades africanas que chegaram a Portugal a partir dos anos 80, mas atualmente conta com artistas de Norte a Sul.
Da primeira referência musical aos desafios enquanto artista independente
E é no Sul que encontramos INFANTE, nascido no Alentejo e a viver no Algarve desde os 24 anos, altura em que decidiu seguir o sonho da música. Cresceu no seio de uma família grande e toda ela ligada à música. Entre primos que foram seguindo caminhos nos vários ramos da música, tanto no canto como na composição, estava Ricardo com a sua passagem pelo conservatório no qual teve aulas de canto, de piano e teoria musical.
Começou por ouvir Boss AC em miúdo, quando um amigo lhe passou o álbum em mp3, mas atualmente afirma não ter uma referência principal. “Eu procuro explorar várias coisas porque
se tiveres a tendência de ouvir sempre a mesma coisa, acabas por ser um pouco idêntico e seguir aquele modelo. Então eu tento ouvir músicas de outras nacionalidades, porque o feeling é diferente, a mensagem também é diferente e é sempre bom ter essa abrangência”, explica o artista.
Além de não se associar a um único artista enquanto referência, INFANTE também não gosta de se associar a um único estilo de música.
Eu não gosto de dizer que faço só um estilo de música. Eu gosto de r&B, gosto de soul, gosto de rap e estes são vários estilos que acabam por estar interligados, mas no geral eu gosto de tudo, até de um fado. Gosto de fazer aquilo que estou a sentir. Se surgir um instrumental ou alguma melodia que eu ache que tem significado suficiente para mim, eu vou por aí
Infante
“Eu sou muito crítico comigo mesmo. Se abrir aqui a biblioteca, veem que tenho cerca de vinte e cinco músicas guardadas e veem que na rua tenho um número bastante reduzido, quando já poderia ter muito mais. Eu sou muito perfecionista e acredito que as coisas têm o seu tempo e o tempo é algo que faz parte do caminho”. O artista realça ainda que o caminho é diferente para todos, uns levam mais tempo e outros levam menos, mas no final o que importa é a aprendizagem que se adquire até chegar onde se quer.
Ainda que considere ser ligeiramente mais difícil inserir o Hip Hop em zonas do interior por serem locais com uma cultura mais presente, Ricardo afirma que o entrave não está no local, mas sim na pessoa. “Para chegares ao topo precisas de ser tu mesmo. Não importa de onde vens, nem para onde queres levar a tua música, importa quem tu és. E chegar ao topo depende sempre de ti e da tua vontade. Não é o local que vai criar algo por ti, és tu, por isso tens de procurar, tens de fazer as tuas cenas e acreditar”.
“Todos os dias são um desafio, mas o mais difícil, para mim, é fazer a minha música com a melhor qualidade possível e de forma a conseguir passar sempre algo de positivo a quem a ouve. A música são sentimentos, são vivências e é isso que eu gosto de partilhar”, refere o artista. Lembrando que a mensagem e a palavra continuam a ser o mais importante num estilo como o do Hip Hop, INFANTE afirma que “o processo criativo é como ir aos treinos, é como jogar à bola. Todos os dias devemos treinar, se nós treinarmos todos os dias a nossa mente e o nosso estado de espírito acabam por criar uma rotina e as palavras surgem de forma muito mais relaxada”.
O artista vs a pessoa, os amigos e os seguidores
As diferenças que INFANTE encontra entre o Ricardo artista e o Ricardo pessoa são quase nulas. Tentando ser sempre a mesma pessoa, a única diferença que o artista afirma encontrar é a de que “talvez o Ricardo pessoa seja mais relaxado. A explosividade está nos dois lados, acredito que sou explosivo da mesma forma, mas no geral isso acontece por ser uma pessoa muito exigente. Exijo muito até de mim mesmo e às vezes até penso um pouco demais, mas isso é porque eu gosto que as coisas saiam perfeitas”.
Para levar o seu caminho avante, Ricardo Infante afirma que tenta rodear-se de pessoas positivas para poder retirar o seu som daí, pois “ao fim ao cabo, somos feitos daquilo que nos rodeia e é sempre bom absorver o que há de bom nos outros quando eles têm algo de bom para nos oferecer”.
Algo que também é importante é o apoio de amigos e, nesse campo, INFANTE admite ter imenso apoio. “Os meus amigos apoiam-me muito, de uma forma ou de outra. Uns estão mais presentes, outros nem tanto, mas não é por isso que deixam de apoiar. Não me posso queixar”.
Prova desse apoio é João Calado, um amigo e colega de Ricardo que começou por ser um simples seguidor. “Eu conheci o INFANTE num dos primeiros concertos dele. Gostei muito da sua prestação e depois disso comecei a ser um seguidor mais assíduo do trabalho dele. Com o tempo fomos mantendo contacto, até porque eu também já fazia música e a química com o INFANTE foi instantânea”. João afirma, ainda, que tem em Ricardo a pessoa que o ajuda a seguir o caminho certo na música e um dos seus melhores amigos. Além disso, João Calado vê, em Ricardo, “uma das pessoas mais humildes e dedicada que conheço. Ele ama realmente aquilo que faz e foi esse sentimento mútuo pela música que nos uniu”.
Já Ana Freitas não conhece o artista pessoalmente, mas segue o seu trabalho desde o dia em que uma amiga lhe mostrou uma música dele. “Honestamente, o Hip Hop era um estilo de música que até à altura não me chamava atenção. Achava que era um estilo mais direcionado para os rapazes. E quando a minha amiga me falou dele fiquei um pouco receosa, mas encarei aquilo como mais uma experiência. E desde aí, sou completamente apaixonada pelas músicas do Infante”.
A primeira música que Ana Freitas ouviu do alentejano foi ‘Balança’ e afirma ter percebido, logo nessa música, o dom do artista para passar uma mensagem com a sua música. “Eu acho que para além de saber cantar é preciso saber passar uma mensagem… O talento por si só não chega, é preciso alma. E o INFANTE tem o talento e a alma para poder vingar na música, apesar do seu trabalho ainda não ser muito conhecido”, completa a jovem de 23 anos.
Do primeiro palco aos projetos do futuro
Numa altura em que o R&B e o soul começam a ganhar espaço nas rádios de música comercial, INFANTE lembra que “comercial é aquilo que vende e que fica no ouvido da pessoa” e que, por isso, transformar um som em algo comercial depende, em muito, de quem ouve, uma vez que é necessário que o público queira ouvir e consumir. E a verdade é que o público já começa a querer ouvir o que o artista de origens alentejanas tem para dizer em cima de um palco. “Subir a palco pela primeira vez é um bocado assustador, mas é muito bom. Há pessoas que dizem que não sentem aquela ansiedade de entrar em palco, mas eu acho que quando não sentes isso acabas por também não sentir a magia real da música”.
Vivendo da magia e do sentimento que tem pela música, INFANTE admite que, “se só pudesse escolher uma música para cantar para o resto da vida, escolhia a ‘Balança’. A ‘Balança’ é um equilíbrio, é a música que mais me retrata e sei que a vou sentir até ao infinito. É uma música mais sentimental para mim, mais introspetiva”.
Com um balanço positivo no que diz respeito ao seu percurso, INFANTE afirma que o seu primeiro álbum está perto de chegar. Com feats e colaborações a caminho, o artista revela a vontade que tem de trabalhar com artistas como Gson, Sam The Kid, Slow J, Regula, entre outros. Mantendo sempre um equilíbrio entre o sonho e a realidade, o alentejano lembra que “na música tudo surge e eu também já trabalho com muitos artistas de quem me orgulho e com quem adoro trabalhar. Aliás, o principal objetivo também é esse, fazer o melhor e adorar o que se está a fazer”.
O amor pela música e a importância de ser feliz
“É por amor que vou construindo o meu caminho na música, e quando deixar de ser por amor então também deixa de ser genuíno. Enquanto houver amor e eu tiver algo para dizer, eu irei continuar a cantar”. Reforçando a paixão que tem pela música, Ricardo não deixa de frisar que a chave para o sucesso é o trabalho e que, sem trabalho, nada se faz. O cantor admite que a sorte também é um fator crucial, mas que sem investimento nunca se verá um retorno. “Sem investimento não tens retorno. E o investimento tem várias formas: pode ser dinheiro, pode ser tempo, pode ser trabalho… Não esperem é que as coisas sejam dadas e que caiam do céu, porque isso não vai acontecer”, salienta.
Num caminho que considera ser positivo, Ricardo Infante afirma que só lhe falta ver o seu trabalho a chegar às pessoas. “Isso é algo que vem e eu tento usar os meus melhores meios, por isso acho que me falta só um pouco de sorte para ver a minha música chegar longe. Sei que tenho a qualidade para lá chegar”.
Num cenário hipotético e em tom de brincadeira, INFANTE admite que se pudesse voltar atrás no tempo para falar com o Ricardo de dez anos, “dizia-lhe para começar mais cedo, dizia-lhe que estava a dormir e que precisava de abrir os olhos e começar a trabalhar”. Já a um Ricardo do futuro, o artista afirma que esperava encontrar-se feliz e que essa seria a primeira coisa a perguntar. “Queria saber se ele é feliz e se é concretizado porque isso é o mais importante. Se não for feliz com a música então algo não está bem. A música para mim é vida, e eu vou buscar vida à música”.