Análise do filme 1984: relação com o presente e comparação com o futuro
“Quem controla o passado, controla o futuro. Quem controla o futuro, controla o passado” – George Orwell. O filme 1984 começa com uma frase interessante, a partir da qual é possível compreender que o cenário é de uma utopia ditatorial, onde as pessoas são controladas o tempo todo por uma autoridade chamada “Big Brother”, onde há também uma teletela, que “dita” as regras dentro dessa sociedade.
Por Fernanda Santana
Nessa sociedade fictícia, o mundo é dividido entre três super continentes, sendo eles a Oceania, a Eurasia e a Eastasia, que se encontram constantemente em guerra. Nessa realidade tudo o que acontece é como o partido deseja que aconteça. Nada além do amor ao partido deve existir, seja o sexo, seja as relações humanas, tudo isso é considerado abominável dentro dessa realidade pois apenas o amor ao partido é visto como importante.
Um dos maiores crimes que alguém pode cometer nessa utopia ditatorial, é o crime do pensamento, como se percebe numa das frases ditas durante o filme: “o crime de pensar não implica a morte. O crime de pensar é a morte”. Crianças são doutrinadas desde cedo dentro desse contexto, para denunciar que cometesse tal crime, mesmo que fossem os seus próprios pais.
O personagem principal é o Winston Smith, membro do Partido Externo, que trabalha para o Ministério da Verdade, que é responsável pela propaganda e pelo revisionismo histórico. Seu trabalho é reescrever artigos de jornais do passado, de modo que o registro histórico sempre apoie a ideologia do partido, visto que o partido nunca erra, e que toda a propaganda feita é para mostrar que o partido é infalível e inquestionável.
O conceito de duplo pensamento é visível no trabalho de Winston Smith, e um dos exemplos no filme é visto na cena da ração de chocolate, onde chega uma informação de que a ração vai ser reduzida, mas o Winston muda a informação para algo positivo ao dizer que na verdade, a ração de chocolate vai ser aumentada. Sendo assim, Winston sabe de toda a verdade, mas ao mesmo tempo ele precisa entrar uma contradição porque ele precisa acreditar do que o partido diz.
A linguagem também é um ponto importantíssimo a ser analisado no filme. Com o passar dos tempos, a língua foi modificada para uma newspeak, que era uma língua mais compacta. A linguagem é a maior forma de expressão humana, com a língua nós podemos desenvolver o raciocínio, é como podemos mostrar as nossas formas de expressão, e tirar isso faz com que a sociedade se torne inexpressiva e submissa, e ao querer criar uma novilíngua, o partido busca exatamente criar uma sociedade binária, sem pluralidade.
Podemos correlacionar a situação da novilíngua com o presente, pois ultimamente a pluralidade das ideias vem sendo limitada, por exemplo, quando uma pessoa diz que “ou você é de direita, ou você é de esquerda”, dando a sensação de que não existe nada mais além dessas duas opções, não existe outra forma de pensamento, não tem possibilidade de um meio termo ou criação de novas soluções.
No período entre guerras a democracia ainda era vista como uma experiência e não como uma normalidade. Durante o filme é possível reparar que os três super continentes existentes vivem numa constante guerra que parece não ter fim. Apesar da realidade construída no filme mostrar semelhanças com o estado soviético, existem também críticas ao regime totalitário de direita, que foi o nazismo.
Um grande exemplo disso é o Goldstein, que é inimigo do partido, e, automaticamente, inimigo de toda a população. Durante o filme são mostrados os “2 minutos de ódio”, que consistem em tirar todos os dias 2 minutos para colocar Goldstein numa tela, apenas para a população criticar aquele que tenta quebrar o sistema. Uma curiosidade é que Goldstein é um nome judeu, e pode ser utilizado como uma referência ao que a Alemanha nazista fez com os judeus.
Na Alemanha nazista, absolutamente tudo o que acontecia era culpa dos judeus, quer problemas na economia, quer problemas sociais. Ou seja, a criação de um inimigo comum pode ser também uma crítica ao nazismo, visto que o partido cria uma ameaça que não existe para que as pessoas canalizem todas as suas frustrações nesse inimigo que foi criado, que no filme é Goldstein.
Na minha concepção, o filme não é apenas uma crítica ao socialismo/comunismo, mas sim a toda e qualquer forma de regimes totalitários que sejam um impedimento ao pensamento da população, um impedimento para a democracia. A obra de Orwell é uma crítica a tudo que possa fazer com que o ser humano não seja capaz de alcançar a razão, visto que toda a razão é submetida no discurso do Big Brother.
O trabalho do Winston Smith é algo crucial na obra e há uma frase que diz que “o jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique. Todo o resto é publicidade”. Tudo o que Winston faz é publicidade para o partido, pois os acontecimentos verídicos são escondidos e tudo o que mostra a verdade, não é repassado.
Essa questão pode ser utilizada para avaliar a comunicação social atualmente. Apesar de o filme e a obra serem antigos, infelizmente existem situações que podem ser aplicadas para os dias de hoje, sobretudo face aos casos de informações publicadas nas redes sociais que não são totalmente transparentes sobre determinados assuntos e que buscam sempre favorecer uma ideologia ou até mesmo, um partido.
O filme acaba com o Winston Smith sendo forçado a acreditar que tudo o que ele percebeu sobre as mentiras contadas pelo partido eram apenas coisas criadas por ele mesmo. A frase “liberdade é a liberdade de dizer que dois mais dois são quatro” é o que Winston Smith fala enquanto é torturado, mas o partido mostra que dois mais dois pode ser cinco, dois mais dois pode ser exatamente o que o partido quiser que seja. Enquanto Winston quer escolher a lógica, o partido quer rejeitar a lógica em prol de si mesmo.
Esse filme faz com que nos questionemos sobre diversas coisas, e nos faz conectar os acontecimentos do filme com a realidade em que vivemos, afinal de contas, no mundo de hoje com tanta tecnologia crescendo e a inteligência artificial avançando cada vez mais, quem pode nos garantir que o Big Brother não está nos assistindo?