Super Terça-Feira deixou dilema aos Democratas, Média Terça-Feira já o resolveu

“Here we go again” é uma frase das mais típicas dita pelos norte-americanos, sobretudo quando se fala de política. Uma frase que teve origem nas Presidenciais de 1980, dita pelo carismático candidato Ronald Reagan quando criticava o Presidente cinzento, Jimmy Carter, quando não saía do mesmo discurso e desde então, é sempre citada pelos políticos do país mais poderoso do mundo aquando duma situação de resposta ou de começo. É a segunda hipótese que aqui está em causa, de quatro em quatro em quatro anos, os militantes e eleitores do Partido Republicano e do Partido Democrata votam, num período de quatro meses (entre fevereiro e junho) no candidato que pretendem para a presidência dos Estados Unidos da América.

Por Jorge Afonso

Da parte do Partido Republicano está tudo praticamente decidido, Trump será novamente o nomeado. Normalmente o partido do Presidente está sempre com ele para a reeleição, o último caso em que assim não foi, verificou-se em 1992 quando Pat Buchanan desafiou o Presidente George H. W. Bush pela nomeação e apesar de não ter conseguido, isso não uniu o partido e influenciou a derrota de Bush para o democrata Bill Clinton. Basta olhar para este exemplo, para as sondagens e para o voto demográfico, para perceber que os republicanos nunca mais irão cometer o mesmo erro.

A situação é bem diferente no Partido Democrata, onde a luta já aqueceu, tremeu, encheu de pretendentes e agora está reduzida a dois caminhos. Até à terça-feira passada (mais conhecida por Super Tuesday), os democratas votaram em quatro estados: Iowa (Bernie Sanders ganhou em voto popular, mas venceu Peter Buttigieg em delagados), New Hampshire (Venceu Sanders, com Buttigieg à espreita em segundo), Nevada (Sanders sobrepôs-se a Biden) e Carolina do Sul (Biden esmagou).

Nos Estados Unidos da América, vota-se nas eleições primárias, estado a estado, num candidato, para que o mesmo tenha o maior número de delegados consoante a sua percentagem de votação. Neste campo, o socialista assumido Bernie Sanders ia na dianteira com 58 delegados, o antigo Vice-Presidente de Obama, Joe Biden, era segundo com menos oito, o jovem Pete Buttigieg era terceiro com 26(entretanto desistiu depois da derrota na Carolina do Sul) e no quarto posto, ainda com hipóteses(até então) estava Elizabeth Warren, a Senadora do Massachusetts que se tornou famosa pelo seu infeliz confronto com os bancos em 2008.

Para assegurar a nomeação do Partido Democrata na Convenção de Julho, em Milwaukee (Wisconsin), são precisos 1990 dos 3979 delegados, sendo que cerca de um terço desses delegados ficaram decididos no passado dia 3 de março, na Super-Tuesday, onde foram a votos 14 Estados e 1 território. Costuma-se dizer que num embate equilibrado, são os pormenores que fazem a diferença e neste evento foi tal e qual, assim.

Com Joe Biden atrás, desgastado pelo processo de destituição de Trump onde foi referido por ser pai de quem é e com o azar do seu eleitorado típico só estar presente apenas em um estado dos quatro que tinham ido já a votos; com Bernie Sanders à frente com apoio declarado da ala mais esquerda do partido, dos jovens e de alguma classe operária, a precisar agora de se abrir a outras comunidades sociais para reforçar a liderança; com Elizabeth Warren a poder vir a ser o John Kasich(candidato republicano de 2016 que apesar de perder tudo para Trump e Cruz se mantinha na corrida) desta eleição e com Michael Bloomberg a querer chegar à presidência de forma mais moderada do que Trump, mas pelos mesmos meios, tinha de ser uma das partes no mínimo a marcar uma posição clara e foi o antigo vice de Obama a fazê-lo.

Na noite da Super Terça-feira vimos um Super Biden. O candidato oriundo do Delaware venceu em 10 dos 14 estados, arrebatando no Sul a nível de votação e delegados e causando até alguma surpresa em estados onde a esquerda se dividiu ou optou pela independência de Bloomberg. Texas, Carolina do Norte, Virgínia, Tennessee, Alabama, Oklahoma e Arkansas foram vencidos sem surpresa por Biden, mas surpreendentes foram os estados de Maine, Massachusetts e Minnesota terem ido para o mesmo, quando se previa irem para Sanders, onde vencera Hillary há quatro anos. Já o Senador do Vermont além de vencer o seu estado natal, marcou a sua posição vencendo na Califórnia, Colorado e Utah. Michael Bloomberg apenas se contentou com a vitória na Ilha de Samoa, irrelevante para as contas finais.

Pode concluir-se que Sanders perdeu a vantagem que tinha, pois continuava só a ter os seus apoios iniciais já referidos, podia não segurar a maioria da classe trabalhadora e não cativava muito as comunidades latinas e afro-americanas, tendo o contrário ter sido conseguido por Biden. A Warren e Bloomberg só lhes restava suspender as campanhas por falta de resultados e para clarificar a corrida em dois caminhos.

A tendência verificada nesta semana, verificou-se na seguinte em todos os sentidos. No dia 10 de março, mantendo um discurso moderado, centrista e somando apoios durante a campanha, Biden vence Missouri, Mississippi, Idaho e Michigan, com surpresa para estes últimos dois que normalmente seriam ganhos por Sanders. O mesmo só venceu no pequeno estado do Dakota do Norte e a verificar-se um empate de 17 delegados no estado de Washington… com Biden a vencer no voto popular, quando se esperava ser Sanders. Se a Super Terça-Feira deixou dilema aos Democratas, a Média Terça-Feira já praticamente o resolveu.

Apesar de ainda se esperar pela eleição em estados, ora tradicionalmente democratas como Nova Iorque, Illinois ou Nova Jérsei, ora em estados divididos e decisivos como Flórida, Pensilvânia ou Ohio, penso que dificilmente Sanders conseguirá ganhar claramente na maioria destes estados a ponto de ultrapassar Biden e conseguir o apoio da maioria das alas moderadas e até minoritárias do eleitorado. Com a vontade de implementar um Serviço Nacional de Saúde num país sem essa tradição, a demagogia de perdoar a dívida a todos os estudantes, com opiniões pouco claras sobre regimes autoritários(perturbado no caso da Venezuela) e com um discurso nada agregador em relação a quem pensa um pouco diferente dentro do partido do burro, embora não sendo impossível, seria muito difícil um socialista derrotar Donald Trump num país capitalista.

Por estas razões, Joe Biden embora não sendo nenhum messias, ao vencer a corrida democrata pode oferecer aos norte-americanos uma liderança mais calma e moderada, ao ponto de ser considerada profissional ao contrário da atual que em muitos campos parece amadora. Os EUA atualmente num momento de muitas questões mundiais, precisa de uma liderança mais pronta e profissional, isso pode acontecer com um Trump mais experiente agora e com mudanças profundas na administração, ou com Joe Biden na presidência. Não negando a primeira opção, a segunda parece mais segura.

Seja de direita ou de esquerda, o populismo é muito bom para ganhar eleições, mas empobrece as nações, rima e é verdade. Os problemas poderão começar no dia seguinte, se não, será mais tarde. Pois não há memória de nenhum populismo ter acabado bem.

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