“Escolhe um trabalho de que gostes, e não terás de trabalhar nem um dia na tua vida”
Sandra Morais, natural de Aveiro, é uma professora de canto com alguma bagagem tanto de formação como profissionalmente. Desde os 7 anos que tem ligação muito forte com a música, o que a levou a começar a estudar música muito nova. Tem o melhor dos dois mundos, o prazer de ensinar música a jovens, já que a sua primeira paixão era ser educadora de infância. Tem formação clássica a nível de técnica vocal e flauta transversal. Atualmente, dá aulas em Aveiro, em Águeda e tem alguns projetos a nível profissional um pouco por todo o país.
Quem é Sandra Morais?
Sandra Morais Iniciei os meus estudos musicais na Escola de Música da Tuna de Santa Joana sendo elemento do coro e membro fundador do coro de câmara “Capella Antiqua”. Prossegui a minha formação académica no Conservatório de Música de Aveiro de Calouste Gulbenkian onde ingressei na classe de técnica vocal e repertório de Maria Ana Fleming, terminando o curso de Canto com elevada classificação. Desde então prossegui os estudos de canto com Margarida Reis, com Claire Vangelisti, Pat McMahon e atualmente com Isabel Alcobia.
Enquanto elemento do Grupo Vocal da Fundação Cupertino de Miranda/ Orquestra do Norte, canto e represento na ópera Don Pasquale de G. Donizetti, canto a parte coral da 9ª Sinfonia de L. Beethoven, canto e represento a ópera As Bodas de Fígaro de W. Mozart, Tosca de G.Puccini, a ópera Inês de Castro de Persiani, La Traviata de G. Verdi, o Stabat Mater de A. Dvorak em Coimbra integrado na Coimbra Capital Nacional da Cultura 2003 e a Missa de Requiem de W. Mozart.
Enquanto aluna da Universidade de Aveiro/ Orquestra Filarmonia das Beiras canto e represento o musical O Mundo Mágico da Bela e do Monstro no papel de Armário, Flauta Mágica de W. A. Mozart no papel de 3ª dama, Orfeu nos Infernos de Offenbach no papel de Juno, Don Giovanni de W. A. Mozart no papel de D. Ana, Carmen de G. Bizet no papel de Cármen, Maria do Mar, obra cinematográfica para orquestra e piano, Suor Angélica no papel de Suor Genovieffa e Gianni Schicchi no papel de Nella, ambas de G. Puccini. Trabalhei com os maestros Ferreira Lobo, Armando Vidal, Felix Carrasco, António Vassalo Lourenço, Vasco Azevedo e Ernesto Coelho, tendo trabalhado em ópera com os encenadores Tim Colman, Carlos Avilez, Norma Silvestre, Carla Lopes, Mário Moutinho e Ms. Carlen Graham.
Realizei uma parceria com a cantora Yolanda Soares, aquando da sua digressão no lançamento do novo álbum “Metamorphosys” e com o coliseu do Porto na realização do concerto de gala para a abertura da ala pediátrica do hospital S. João.
Atualmente, a nível profissional, que tipo de funções exerce e onde?
SM Atualmente exerço função como docente de Canto e Classe de Conjunto no conservatório de Música de Águeda, Técnica Vocal e flauta transversal na MUSA e dirijo os coros, Casa do Povo do Troviscal e Recanto de Fermentelos.
Sempre quis seguir música? Porquê?
SM Na verdade, a música apareceu na minha vida, como carreira, quando me fui inscrever na faculdade, passo a explicar. No primeiro ano da faculdade queria escolher educação de infância, mas quando fui para realizara matrícula a senhora da secretaria disse-me que já não havia vaga para esse curso. Então perguntei-lhe que outros cursos eram lecionados e ela começou por música, nem lhe dei tempo para continuar, disse lhe “É esse mesmo!”. Música passou a ser a minha profissão, mas já fazia parte da minha aprendizagem em criança, como atividade. A partir desta inscrição, levei a música ao colo para todo o lado. Para colmatar o facto de não ter escolhido a minha formação inicial, de educadora de infância, todos os dias trabalho com crianças, o que me dá um prazer enorme.
Quais foram os seus primeiros passos no mundo da música?
SM Quando era mais miúda, comecei por pertencera uma associação local onde cantava no coro e tocava flauta. A minha primeira grande atividade foi participar num festival da canção infantil. Não ganhei, mas recebei prémio de melhor letra e música!
Quando é que se apercebeu que a música seria a sua área de profissão?
SM Profissão igual a satisfação, típica frase “Escolhe um trabalho de que gostes, e não terás de trabalhar nem um dia na tua vida”. Quando estava com uma miúda pequena e ela pediu-me ajuda nos trabalhos de formação musical, tive um gozo imenso em ajudar e explicar aquela matéria. Foi aí que eu percebi que podia juntar o útil ao agradável, o meu amor pela música com a vontade de ensinar.
Como é que a sua família reagiu à decisão de querer fazer da música a sua profissão?
SM Foi uma reação bastante positiva, visto que eu já passava algum tempo dedicado à música. Na verdade, eles viam a forma como eu me sentia bem e confortável nesta área. A minha família nunca me impediu de fazer nada onde eu não me sentisse bem, aliás, ao longo destes anos de carreira, sempre foram o meu pilar. Estiveram em todos os momentos importantes, sempre com um apoio incondicional e uma palavra de orgulho.
Entre dar aulas e os concertos, qual delas lhe dá mais prazer em fazer?
SM Para mim não existe uma sem a outra. Se por um lado, dar aulas é a forma prática do nosso conhecimento, fazer concertos é transportar o público para um mundo imaginário cheio de magia e até algum drama, é fazer com que o público consiga sentir o que a música está a tentar transmitir. Uma complementa a outra, até porque uso vários exemplos na aula de situações minhas em concertos. Tento que os meus alunos, nos seus espetáculos, se sintam confortáveis, da mesma maneira que eu me sinto quando estou em palco.
De todos os géneros musicais, qual deles é que lhe desperta mais interesse e porquê?
SM Sem dúvida que para mim o estilo musical que mais me interessa é a ópera e o canto lírico. Consigo assumir uma personagem, criar um papel, inventar cenário… e depois tudo volta ao normal. Para mim é a “mãe” de toda a música, sem o estilo clássico não existiria maior parte da música que existe agora.
De todos os alunos que passaram pelas suas mãos a longo dos anos, teve algum que se tenha destacado?
SM Todos os alunos são um desafio constante. Não existem vozes nem timbres iguais. Mas na verdade existiu um(a) aluno(a) que chegou às minhas aulas com um problema vocal e neste momento, aplicando exercícios adequados e músicas próprias, o problema desapareceu e a tessitura vocal do(a) aluno(a) subiu. Por mais que alguém tenha um talento natural para o canto, isso não chega. O treino e os ensaios são uma parte fundamental para que os alunos possam atingir o seu máximo potencial. Os alunos quando entram para as aulas de canto, têm sempre o sonho de se tornarem grandes cantores, mesmo que não o admitam. Mas nem sempre surgem as oportunidades certas para que esse talento seja aproveitado.
Tendo em conta que em Portugal, não existem muitos apoios para os pequenos músicos e para as artes (teatro, música), nunca pensou em ir para fora?
SM Sim já me passou várias vezes pela cabeça, mas faltou a coragem de sair na altura e agora a idade já não ajuda. Sim porque isto de cantar tem a sua longevidade reduzida. Quando se é novo ainda podemos “tentar” modelar a nossa voz, agora quando chegamos a uma certa idade, a voz já não é o que era e já não muda. Atualmente, em Portugal, já existem mais oportunidades para os jovens talentos, o que não existia na minha juventude. Obviamente que, nessa altura a minha vontade de sair era enorme, mas nunca surgiu a oportunidade. Quem sabe, se eu tivesse dado o salto, a minha vida não seria completamente diferente.
O que sente em relação a toda esta polémica da cultura e à falta de financiamento sobre as artes?
SM Enquanto as pessoas continuarem a pensar na cultura como uma opção menor e não como uma profissão de vida, as nossas vivências culturais nunca passam do espaço de ensaio e raramente saem para o público com crédito merecido. Há muito talento escondido neste país e com a falta de apoios, as pessoas tendem a ir para o estrangeiro à procura de novas oportunidades, assim como em todas as áreas. Pois, hoje em dia o talento só é reconhecido se a pessoa já for conhecida. Em Portugal o reconhecimento que se dá à cultura é um pouco reduzido, apesar de sermos um povo que liga imenso à cultura e à transmissão dela, as nossas ações e o apoio que esta recebe, não são um bom reflexo disso. A meu ver, o poder da mudança em relação a isso está nas mãos das gerações seguintes, pois, se os apoios à cultura começarem a diminuir cada vez mais, como é que a vamos conseguir transmitir?
O que mais se orgulha de ter conquistado na vida?
SM Orgulho pelo trabalho desenvolvido junto dos alunos e da sua progressão como cantores, porque apesar de serem amadores, continuam a ter um talento incrível.
Onde é que se imagina daqui a 15 anos?
SM Daqui a 15 anos … a ouvir um dos meus alunos cheios de sucesso. Sentir orgulho no seu desenvolvimento tanto a nível pessoal como profissional e perceber que todo o trabalho que ele/ela desenvolveu ao longo da sua aprendizagem deu os seus frutos.
Qual é a música da sua vida?
SM “La Traviata” de G. Verdi. 1ª Opera cantada em coliseu.
Se não fosse professora de música o que é que seria?
SM Se não fosse o que sou hoje seria educadora de infância. Na verdade, o meu sonho sempre foi ensinar, ser capaz de ensinar alguém a ser melhor.
O que é que a música significa para si?
SM Música para mim é mais que uma arte… é uma forma de vida! A música consegue provocar-nos sensações tanto boas como más. A meu ver, nós temos sempre a tendência em escolher uma música que se adeque ao nosso estado de espírito nesse mesmo dia, tanto nos podemos sentir bem ao ouvi-la, como também nos podemos sentir a pior pessoa do mundo. Conseguimos ter um misto de emoções incrível, somos transportados para o nosso pequeno mundo. E é esse o objetivo da música, é termos acesso a todas estas emoções, e quando as podemos partilhar com alguém, então aí torna-se mágico.
Texto: Ana Isabel Sousa