Samuel Úria: “Já nasci agarrado pela música”
Com origem marcada pelo punk rock, Samuel Úria tem ganho notoriedade desde 2008 pela sua singularidade. Começou a sua carreira na música como líder da banda Samuel Úria & As Velhas Glórias, atualmente reconhecido pelos seus trabalhos a solo e considerado um dos mais importantes cantautores portugueses da atualidade.
Reportagem de Mariana Úria e Imagem de Vitorino Coragem
A música surgiu desde cedo, “como uma necessidade básica”, na vida de Samuel Úria. O músico afirma, também, que as suas primeiras experiências musicais transformaram o seu interesse por ouvir, num “interesse de querer produzir, querer fazer algo mais”.
Bob Dylan, Leonard Cohen, Sérgio Godinho e Jorge Palma são alguns dos artistas que Samuel Úria considera como grandes inspirações, e admite que mesmo não sendo “influências conscientes” que procura para escrever as suas músicas, são “influências inconscientes que hão de estar sempre presentes nem que seja pela vontade de fazer música”. O cantor já teve a oportunidade de colaborar e partilhar palco com alguns destes artistas, como Sérgio Godinho e Jorge Palma. “Sinto que existe uma grande vontade das pessoas colaborarem e então tem-se tornado muito fácil conhecer músicos e criar relações de amizade rápida, das quais nascem colaborações musicais. Isso é uma coisa muito bonita. Nesse sentido tenho cumprido os meus sonhos”, esclarece.
Canções do Pós-Guerra é o álbum mais recente do cantor. Foi escrito em 2019, ainda antes da pandemia, mas Samuel Úria considera que há um leque de músicas que já pareciam adivinhar o que estava para vir. “Há canções do disco que já pareciam adivinhar coisas tumultuosas que aí vinham”, explica o cantor.
Embora ainda não tenha tido a oportunidade de apresentar o álbum ao vivo, na integra, pela escassez de concertos e publico, o cantor considera que é o seu disco preferido. “É um disco que ainda sinto como novo, porque ainda tenho que o defender e, nesse sentido, tem de ser o meu filho preferido”. A sua música favorita é o primeiro single do álbum, denominado “Fica Aquém”, que é uma canção de protesto contra “males universais de outros tempos, mas que se pode aplicar àquilo que se está a desenrolar agora”, esclarece Samuel Úria.
“Ainda não estou cansado de palco”
Quando fala de recordações, Samuel Úria destaca imediatamente o que sente quando está em palco. “Todos os momentos passados em palco, ou mesmo depois de sair do palco, são recordações bonitas. É um misto de alegria e de humildade por perceber que estou a tocar em pessoas sem ter feito nada por isso. Só faço cantigas e há pessoas que vêm falar comigo como se lhes tivesse transformado as vidas. Não me sinto merecedor de tanto”, diz.
Do Norte ao Sul do país, todos os concertos ao vivo deixam boas recordações na vida do cantor desde que sobe ao palco e mesmo quando sai dele. Samuel Úria explica que estar no palco a ouvir as pessoas a acompanhar e a vibrar com as suas músicas, o faz “sentir vivo e muito afortunado”.
Tempos difíceis e a “fome de palco”
O aparecimento da COVID-19 deixou o setor cultural de rastos. Samuel Úria explica que a “fome de estar em palco já era constante numa suposta normalidade” e que com os confinamentos e restrições impostas essa “fome” tornou-se numa voracidade. Para lá disso, o cantor admite que houve sempre dificuldades na cultura, por ser vista como o setor mais frágil.
Porém, Samuel Úria acrescenta que houve lições positivas, porque os tempos difíceis vieram criar uma notória união entre todos os setores. “Não foi pautado por competitividade, era uma questão de unir esforços para que tudo pudesse correr melhor”, explica.
A família e a música
Madalena Úria, mãe de Samuel Úria, expõe que quando o cantor era apenas uma criança, “os livros lhe enchiam os dias, com especial predileção para os de desenhos animados.” O gosto pelos livros fez nascer, na vida de Samuel Úria, um desejo de desenhar histórias. Deste modo, o cantor tirou um curso de Educação Visual e foi professor durante vários anos. Profissão esta a que se viu obrigado a desistir, porque a música lhe “consumia demasiado tempo”, profere a mãe.
O contacto com a música começou quando Madalena Úria inscreveu o cantor e a sua irmã numa Escola de Música, da qual ambos desistiram. “A irmã, entretanto, foi aprender a tocar Viola e creio que foi esse o instrumento que o levou a aproximar-se verdadeiramente da música”, relata.
De acordo com a mãe do cantor, Samuel começou a aprender a tocar viola sozinho e a compor as suas músicas juntamente com outros colegas. “Sempre o conduzi até casa deles, ajudando-o a levar um grande e pesado amplificador… Hoje rio-me da cena”, relembra.
Madalena Úria diz sentir-se orgulhosa com todas as escolhas de Samuel Úria e que “falando não como ‘a mãe’” considera que o cantor escreve muito bem, “tanto a letra como a música, o que o torna um artista completo”.
“Sinto portugalidade”
Desde o início da sua carreira que Samuel Úria tem vindo a ganhar fãs de todos os cantos do país. O cantor afirma que há sempre um grupo de pessoas que o acompanham em todos os concertos e que são pessoas assim que o fazem sentir tão “afortunado”. “Quando faço música não é só por mim, mas também pelas pessoas que vibram comigo”, conta.
Afonso Ramos, 21 anos diz que quando começou a ouvir música portuguesa e a desenvolver o seu gosto musical, Samuel Úria foi um dos primeiros artistas em que se interessou. “Lembro-me de estar a descobrir os outros projetos do Manuel Cruz, vocalista dos Ornatos Violeta, e encontrei uma música chamada Lenço Enxuto. A partir daí fazia parte da música que ouvia no meu dia a dia”, explica o jovem.
O seguidor conta também que as músicas do cantor o fazem sentir o que sente “com alguém que escreve português”. “Acho que escrever bem português é um feito muito difícil de alcançar no que toca à música, e se me perguntarem quais as pessoas que eu mais aprecio ouvir e que escrevem em português, o Samuel está nessa lista. Sinto “portugalidade” e sinto muita coisa, que com a mistura da guitarra e do rock que tanto gosto, me faz viajar por lugares que poucos artistas fazem”, declara.
A sua música favorita chama-se “é preciso que eu diminua”, do álbum “Carga de Ombro”. “A letra, a melodia e a forma como está construída é incrível”, confessa Afonso Ramos. O seguidor acrescenta também que a versão da música “Chamar a Música”, adaptada pelo cantor, é uma faixa que ouve com frequência e que merece uma “menção honrosa”.
Sónia Marçal, 52 anos, conta que a primeira vez que ouviu a música de Samuel Úria, foi através de familiares tondelenses, “ainda ele pertencia ao grupo Samuel Úria e As Velhas Glórias”. Considera que cantor é um dos melhores autores de música de Portugal. “As letras são geniais, muito intensas e vividas. Cantadas em palco, com a sua energia contagiante, tornam-se ainda mais espetaculares”, acrescenta.
A sua música de eleição é, também, “é preciso que eu diminua”. “A letra e a melodia são fabulosas”, diz. A seguidora refere, também, ter um CD autografado pelo cantor.
“Eu assumo os meus defeitos”
Para os que têm o sonho da música, Samuel Úria acha muito importante não agarrar esse sonho de forma muito personalizada. “Muitas vezes, tentarem ser como os seus ídolos acaba por padronizar em demasia as suas características, porque quando se quer ser igual a alguém, vão haver milhares que querem ser como essa pessoa também”, considera. Não descurar os próprios defeitos e usá-los como elementos de personalidade, é algo que o cantor também considera essencial para sobressair no mundo da música e das artes. “Eu assumo os meus defeitos. Não sou um grande guitarrista, mas a maneira como eu toco as minhas falhas acaba por servir nas minhas músicas de uma forma muito mais pessoal. Não tenho uma grande voz, sou um tipo nasalado, mas aproveito isso para conseguir transmitir emissões de uma forma muito sincera”, acrescenta.
Em 2014, Samuel Úria ganhou um prémio para a melhor canção do ano da SPA (Sociedade Portuguesa de Autores), com o tema “Lenço Enxuto” e embora ligado à música alternativa, a carreira do cantor passa, também, pela escrita de canções e letras para artistas portugueses de renome, tais como Ana Moura, António Zambujo, Clã e Kátia Guerreiro. Por isto, o sucesso do músico tem vindo a ser cada vez mais notório e a sua relação com o publico cada vez mais forte.
Samuel Úria pretende continuar a deixar a sua marca na música portuguesa e a surpreender com as suas edições caseiras.