O Lugar que tem Presente a valorização da dança
A Escola de Dança Lugar Presente é um estabelecimento particular de ensino artístico. Nasceu em 2005 e está sediada em Viseu, ao lado do Teatro Viriato. O seu principal objetivo é o ensino artístico especializado da dança. Foca-se, nomeadamente, no desenvolvimento de cursos de iniciação à dança, promovendo cursos para crianças e adolescentes que frequentam o ensino básico e secundário na região de Viseu. Foi a crescente adesão aos seus pequenos cursos de dança que a Lugar Presente assumiu a sua posição como promotora da dança na cidade de Viseu. Contando com uma média de cerca de 280 alunos por ano, muitos dos que terminam o curso na Escola continuam a apostar no mundo da dança, tanto em Portugal como no estrangeiro.
O objetivo fulcral da EDLP é continuar a realizar um trabalho adequado à comunidade da cidade, bem como apostar nos talentos mais jovens. Ainda que os apoios à cultura sejam escassos, a EDLP sublinha que é importante continuar a investir no espaço, na qualidade do serviço e na formação a todos os níveis. Albino Moura, acredita que é com esforço e trabalho que é possível alcançar grandes objetivos, e que é isso que faz da Escola Lugar Presente, um promotor da arte e do gosto pela dança. “Cultura não é só a Arte. São muitas coisas intrínsecas ao ser humano e ao seu comportamento”. É assim que Albino Moura, membro da Direção e Administrador da Escola de Dança Lugar Presente, se refere ao estado da cultura. Com formação no BalleTeatro do Porto, foi bailarino profissional no elenco da Companhia Nacional de Bailado até 1991. Coreografou, ainda, vários programas para a RTP. Atualmente é, também, professor de Técnica Clássica na Lugar Presente.
Por Joana Simões
Pode contar um pouco de como surgiu a Escola de Dança Lugar Presente (EDLP)?
Esta escola surgiu na sequência de pequenos cursos de dança que a Companhia Paulo Ribeiro começou a realizar desde que se instalou em Viseu, em 1998, aproveitando a disponibilidade dos seus bailarinos, entre períodos de ensaios. Esses pequenos cursos começaram a ter cada vez mais inscrições e foram-se tornando cada vez mais frequentes, até ao momento em que começou a fazer sentido a criação de cursos regulares, de frequência anual, com professores convidados para o efeito. E isso teve início em 2005.
Quais são os maiores desafios de ensinar a arte da dança?
O maior desafio é, no que respeita aos alunos, muitas vezes fazer a diferenciação entre aquilo que é a expectativa do talento, ou seja, os miúdos que têm talento acharem que só porque têm talento vão conseguir alguma coisa. Muitas vezes nós dizemos logo no início que o talento é uma parte muito pequena do processo. 90% do processo é trabalho. Portanto, o talento ajuda, obviamente, facilita, mas o que acontece muito nesta área é que as pessoas que têm mais sucesso são aquelas que trabalham, e não as que têm mais talento. Claro que se trabalhar com talento, atinge-se melhores resultados. Digamos que, na média e em geral, os miúdos que têm talento, e que não trabalham não chegam a lado nenhum. Os miúdos que trabalham e que não têm talento, chegam sempre a algum lado. E os que trabalham e que têm talento, chegam sempre a lugares espetaculares. Muitas vezes esta expectativa é muito difícil de gerir até com os próprios pais, porque muitas vezes perguntam-nos “o meu filho tem talento? O que é que acha? Ele está sempre a dançar em casa, e eu acho que ele tem muito jeito”… Isto para nós, normalmente, significa muito pouco. Para nós, é uma motivação, obviamente, que é importante se ter quando se entra numa escola deste tipo. Mas o jeito, o talento, a aptidão natural, não servem para nada se não houver trabalho.
Como descreve a adesão do público ao vosso espaço?
A adesão tem sido muito boa, com uma média de entre 250 a 280 alunos por ano de todas as idades, entre os 3 e os 53 anos de idade, passando por diversas disciplinas, desde a Dança Criativa para os mais pequeninos, até ao Ioga, Danças Orientais e ao Teatro para os mais adultos, com os estilos Clássico, Moderno, Contemporâneo, Jazz e Hip Hop pelo meio, claro.
E qual é o género de dança mais procurado?
Ultimamente tem sido o Hip Hop, ou as chamadas danças urbanas, talvez por influência dos media e da internet que difundem muito esse género de dança. Mas todos os géneros têm tido procura.
Quais são os critérios de seleção nas audições?
Para além da avaliação das capacidades físicas estruturais, ou seja, proporções do corpo, analisamos também a flexibilidade, força muscular, resistência, equilíbrio. Depois analisamos também as capacidades artísticas expressivas, através de exercícios específicos, incluindo a improvisação com uma música. No caso dos níveis mais elevados, eles (os candidatos) trazem uma peça já preparada que têm de apresentar. Também são avaliados a nível de competências técnicas se vierem para níveis que exijam já alguma preparação prévia de dança.
Considera que a EDLP está a dar o passo na direção certa para desenvolver a cultura em Viseu?
Não temos essa pretensão, mas acreditamos muito que o que fazemos é proporcional e adequado à comunidade em que nos inserimos. A verdade é que, antes desta escola começar a trabalhar existiam apenas duas escolas de dança de caráter privado com cerca de 150 a 200 alunos no total. Neste momento, existem pelo menos 5 escolas de que tenhamos conhecimento, cada uma a trabalhar no seu nicho de mercado, para um universo total que já deve ultrapassar os 500 alunos. A nossa é a única escola com cursos oficiais em regime articulado, reconhecidos e financiados pelo Ministério da Educação e que atualmente conta no total com cerca de 250 alunos por ano em média. No seguimento desse trabalho, começaram a sair os nossos primeiros alunos finalistas há 3 anos atrás. Uns têm optado por continuar estudos superiores em dança em Portugal e no estrangeiro, outros já iniciaram carreira como docentes nesta e noutras escolas, e outros iniciaram carreiras enquanto intérpretes. O objetivo a curto/médio prazo será termos uma companhia juvenil de dança associada a esta escola, para servir como primeira oportunidade de trabalho para estes e para os próximos finalistas. Portanto, parece-nos que o balanço é muito positivo!
Qual o estado da dança atualmente?
A Dança Contemporânea sofre um pouco do mal de incompreensão, muito por culpa dos próprios criadores contemporâneos que apresentam resultados, na maior parte dos casos, demasiado herméticos e pouco apelativos para o cidadão comum. Isto faz com que a Dança Clássica, o chamado Ballet, ainda seja muito evocado quando se fala em dança hoje em dia. Há uma espécie de paradigma retrógrado que não permite que a dança contemporânea se afirme na sociedade do seu tempo, e esteja sempre a ser empurrada para o período áureo do século XIX, seguindo um pouco o velho sonho de todas as meninas que continuam a querer ser princesas numa sociedade onde já não há verdadeiros reis nem rainhas. Mas, como em tudo, há exceções de criações de dança contemporânea absolutamente extraordinárias e que nos fazem acreditar que a evolução histórica continua a existir e a fazer sentido. E é nessa direção que esta escola pretende trabalhar cada vez mais.
Considera que, hoje em dia, as pessoas não valorizam a cultura?
A cultura é um conceito tão abrangente que é impossível descartá-lo do dia-a-dia de qualquer ser humano. Cultura não é só a Arte. São muitas coisas intrínsecas ao ser humano e ao seu comportamento e que se pode associar à história, à sociologia, à antropologia, à ciência, à tecnologia, etc. O problema é a valorização de uma parte importante desse conceito e que no fundo é, para mim, o que nos distingue verdadeiramente dos outros seres vivos, que é a Arte em geral. Que essa sim, por nem sempre ser compreendida, ou querer fazer-se compreender, é algo que é secundarizado na sociedade de uma forma geral. Apesar de todos os paradoxos a que vamos assistindo, com a valorização exacerbada de certas obras de arte e de certos artistas, como acontece, aliás, com certos jogadores de futebol… mas aí entramos em questões comerciais e no próprio capitalismo, que é outra problemática.
Acha que os apoios que têm são suficientes para continuar a promover o espaço de forma eficaz?
Os apoios em Portugal, infelizmente, são sempre insuficientes. Continuamos a necessitar de mais espaço, mas também de mais financiamento para podermos oferecer um melhor serviço às pessoas a um preço cada vez mais acessível, e para também podermos remunerar melhor os nossos docentes e equipa.
Que outros projetos do distrito considera que estão, também, a dar um passo importante para desenvolver a arte da dança?
Sem qualquer dúvida, desde logo a Companhia Paulo Ribeiro, que é a nossa estrutura “mãe” – a companhia de dança que está na origem do Teatro Viriato, o qual podemos considerar como sendo o nosso “pai”. São, a nosso ver os grandes divulgadores e dinamizadores da Dança no concelho e não só.
Como já referiu, muitos alunos optaram por seguir estudos superiores em dança em Portugal e no estrangeiro após a sua saída da Lugar Presente. Acha que a Escola lhes deu as bases necessárias para conseguirem, digamos, “chegar longe” no mundo da dança e alcançar os seus objetivos?
Eu acho que sim. Mas é sempre muito relativo, porque eu costumo dizer que aquilo que faz uma boa escola são os alunos. Não serve de nada termos um belíssimo edifício, excelentes professores, uma direção espetacular, funcionários maravilhosos, se não tivermos alunos. O inverso já é mais possível: já podemos ter uma escola desde que tenhamos alunos e as condições mínimas. Aqui estamos a criar condições para ter excelentes alunos, e é isso que nós pretendemos: é que esta escola se faça da excelência dos seus alunos e, portanto, o trabalho é um pouco nesse sentido: de melhorar a qualidade dos nossos alunos, não só através de um filtro de entrada mais apertado, mas também criar-lhes condições para se desenvolverem o melhor possível dentro das suas capacidades. Em Portugal, os nossos alunos não têm muita dificuldade em entrar em cursos superiores. Em cada cinco alunos que fazem audições para cursos no estrangeiro, pelo menos um entra, o que eu acho que não é mau. Já conseguimos ter um nível, digamos, de formação internacional. Os alunos de todas as escolas do país vão fazer audições para uma escola estrangeira, e temos alunos a entrarem e a competir com as melhores escolas do país. Em Portugal, nós temos cerca de duas ou três escolas que vêm cá fazer audições e normalmente abrem duas vagas a nível nacional. Ou seja, cada escola estrangeira vem cá fazer uma audição e permite a entrada de dois alunos portugueses. Nos últimos anos, desses dois alunos, conseguimos sempre que uma das vagas seja preenchida por nós. A nível nacional, em termos de concorrência com as outras escolas, é bastante bom. Estamos a competir com conservatórios de Lisboa, escolas com muito mais história, e escolas com muitos alunos. Portanto, não tem sido nada mau.
O que considera que ainda está por fazer em termos de cultura e promoção da dança na cidade de Viseu?
Acho que, para além da companhia juvenil de dança, faz falta um festival de dança com uma dimensão internacional que possa dar visibilidade a esta arte e à cidade que a tem acolhido de forma tão importante. Para além de um Centro de Artes do Espetáculo com um auditório capaz de acolher as grandes produções nacionais e internacionais que passam por grandes palcos das principais cidades do país e do estrangeiro.
Como imagina evolução da Lugar Presente nos próximos anos?
Neste momento em que já temos um número de alunos muito interessante e um corpo docente mais ou menos estável, pretendemos que a evolução desta escola passe pelo aumento da qualidade do serviço e dos resultados da formação a todos os níveis. Começando na necessidade do aumento das instalações, que já são muito exíguas para a quantidade de horas semanais de aulas, e terminando na necessidade de aplicação de um filtro cada vez mais apertado para a entrada de novos alunos, que terão de ser selecionados cada vez mais em função da aptidão, capacidades físicas e qualidades expressivas, de modo a podermos ter um nível que seja competitivo com as melhores escolas do país e do estrangeiro.
Na sua opinião, qual diz ser o maior objetivo da Lugar Presente?
Diria que, para além de contribuir para a formação e descoberta de novos talentos, é sensibilizar as pessoas para a Dança e para a Arte em geral, enquanto um dos principais pilares civilizacionais.