Acabei o curso, e agora?
Tudo começa com incerteza, com medo do desconhecido, é o início de um percurso mais sério onde o que está em jogo é o futuro. É uma fase assustadora, mas é, principalmente, uma fase de mudança. João Medeiros, licenciado em Turismo pela Escola Superior de Tecnologia de Viseu, revela o que sentiu neste período da sua vida. “Senti tudo e nada. Senti que foi o fim de um ciclo, de uma etapa. Senti o fim da boémia, dos meus colegas e amigos e o início de responsabilidades acrescidas. Senti o desespero de um recém-licenciado por não encontrar trabalho, ansiedade, má preparação no momento de ir a entrevistas de emprego e imaturidade”.
Por Tiago Pestana
Para Mariana Ribeiro, licenciada em Jornalismo pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, a licenciatura não foi suficiente para que se sentisse preparada para enfrentar este novo mundo: “No fim da Licenciatura achei que era pouco, que tinha estudado pouco, que ainda não me sentia preparada para o mundo do trabalho e que, mesmo que o sentisse, seria muito complicado conseguir trabalho na área”. Seguiu para o Mestrado onde foi trabalhadora estudante no primeiro ano e, no segundo, a investigação para a tese não lhe era suficiente. “Inscrevi-me e concluí uma Pós-Graduação no primeiro semestre e, no segundo, fui para Lisboa realizar um estágio extracurricular no Setor de Imprensa da Representação da Comissão Europeia em Portugal. Adiei meio ano a entrega da Dissertação de Mestrado.” Confessa que, no fim do mestrado, se sentiu realizada, mas “ao mesmo tempo, perdida”.
O receio também é uma característica bem presente nesta fase de mudança. Diogo Figueiredo, finalista no curso de Economia na Universidade Nova de Lisboa, diz que o seu maior receio é “fazer algo em que não tenha completa aptidão, algo que não goste, algo que não me dê muito prazer. Não quero ter um emprego apenas por trabalhar das 9h às 17h e fazer dinheiro, eu quero fazer algo que me diga alguma coisa, que me complete, que me faça sentir que estou a trabalhar não só para mim mas para algo maior”.
Carina Veloso, finalista do curso de Publicidade e Relações Públicas na Escola Superior de Educação de Viseu, revela que o seu maior receio é trabalhar num local onde não se sinta bem. “Se não estivermos bem no nosso ambiente de trabalho, o nosso desempenho não vai ser tão bom como se estivéssemos num local onde gostamos de estar verdadeiramente. Por isso, penso que é mesmo esse o meu único receio… Ficar “presa” a um emprego só por comodismo, mas ficar triste”, afirma a jovem que, no entanto, espera “ter sempre coragem de arriscar e ir em busca de algo melhor ou que me faça mais feliz porque qualidade de vida não é só estarmos bem de finanças”.
Pedro Coutinho, coordenador do curso de Comunicação Social na Escola Superior de Educação de Viseu, refere que os receios dos alunos variam consoante as situações. Numa situação de pré-estágio os receios surgem ao nível da preparação para aquilo que é o mercado de trabalho, após o estágio surge aquele que é visto como o maior medo. “ O principal receio que os alunos por vezes têm é de colocarem o mercado de trabalho num sítio muito elevado, uma espécie de um sonho inatingível, e de não sentirem que o mercado de trabalho é feito de pessoas como eles, com as mesmas capacidades ou, às vezes, até menos”. Para o docente, isto é algo que se deve em grande parte aos discursos da falta de trabalho, “ Como se ter emprego fosse uma obrigação ou como se fosse um objetivo de vida. Fazer algo que se goste é que devia ser um objetivo de vida”. Realça ainda que todos estes receios desaparecem quando a pessoa faz aquilo que gosta.
Fase das dúvidas e dos conselhos- O papel dos professores
Com a fase da mudança e dos receios surge também a fase das dúvidas e da procura por conselhos.
João Ribeiro, licenciado em Design de Comunicação e Produção Audiovisual na Escola Superior de Artes Aplicadas de Castelo Branco, revelou que a maior parte das suas dúvidas foram respondidas pela internet, mas quando se tratavam de dúvidas de maior importância, nomeadamente o seu futuro profissional, “coisas que um robô (ainda) não nos consegue responder, tinha os meus grupos de trabalho, amigos e algumas empresas que, integradas com o programa da minha escola, apresentavam briefings para fazermos alguns trabalhos”.
Para Diogo Figueiredo as dúvidas e conselhos são discutidos não só com professores, mas também juntos dos colegas de curso, “Na faculdade nós falamos bastante sobre o futuro, sobre o tipo de trabalhado que cada um quer, muitos de nós somos um pouco direcionados para empregos muito semelhantes”, afirma.
Nesta fase o papel dos professores ganha outro ênfase, a experiência de vida e o conhecimento dos mercados de trabalho fazem deles os melhores conselheiros.
Para Frederico Garcia, finalista no curso de Ciência Política e Relações Internacionais na Universidade da Beira Interior, os professores são as pessoas mais indicadas para, nesta etapa, darem conselhos. “A nível de aconselhamento, são sem dúvida os professores que lidaram connosco 3 anos durante a nossa formação as melhores pessoas para nos aconselhar para a área de estudos seguinte e mercado de trabalho”, considera o estudante.
No entanto, os conselhos por parte dos professores são, na sua maioria, dados ao longo do percurso académico, sendo que muitos alunos só lhes reconhecem a devida importância mais tarde, como revela Carina Veloso. “Os professores dão sempre imensos conselhos, como é óbvio. São uma voz experiente e devem mesmo ser ouvidos. Pena que por vezes não damos o devido valor ao que eles dizem e só mais tarde percebemos que devíamos ter estado mais atentos e levado mais “a sério” aqueles conselhos”.
Na opinião de Mariana Ribeiro, a preparação que os professores transmitem aos alunos para o final do curso é importante, embora pense que muitos dos conselhos que recebeu não foram de encontro ao estado atual do mundo de trabalho (em particular, na área da comunicação). “Penso que os professores já não estavam muito atualizados do que é, efetivamente, o mundo do trabalho na área da comunicação. É mais cruel do que o pintam nas aulas. Porém, quem for bom, consegue tudo. É uma questão de persistência e profissionalismo”.
“Os professores já não existem apenas para ensinar. Devem também ter mais capacidade de incentivar os seus alunos e supervisioná-los para os poder corrigir de forma correta e intervir no momento certo”. Esta é a opinião de João Ribeiro que sublinha ainda que “a preparação para o mercado de trabalho não deve ser de total responsabilidade do professor para com o aluno”, uma vez que as próprias Escolas deviam ter um papel mais ativo nesse sentido, como por exemplo a realização de mais workshops, mais conferências e, essencialmente, “mais trabalho de meter as mãos na massa”.
Para o docente Pedro Coutinho, o principal conselho, que partilha com os alunos ao longo do curso, é “Apaixonem-se pelo que estão a fazer e, se estiverem apaixonados, deem flores todos os dias à vossa paixão”, esta é a receita dada pelo docente para um futuro risonho a nível profissional.
O papel das Escolas
A escola tem um papel muito importante no que toca à preparação dos alunos para enfrentarem esta nova etapa com confiança. No entanto, esta preparação não é igual em todas as Universidades. Mariana Ribeiro revela que não teve uma preparação prévia e, na sua opinião, a solução passa por tornar os estágios obrigatórios nas licenciaturas pois “é muito importante contactar com a realidade com a qual se vai viver no futuro próximo, perceber os entraves, as dificuldades e o trabalho precário que ainda existe em muitas áreas”.
Na opinião de Luís Madeira, estudante no 2º ano no curso de Comunicação Social na Escola Superior de Educação de Viseu, devem ser feitas algumas coisas para preparar os alunos para o mundo, em particular, do trabalho, mas a iniciativa também deve partir dos próprios alunos. “A iniciativa deve partir dos próprios alunos, são eles que devem demonstrar interesse para procurar o aconselhamento necessário, devem ser eles a procurar pessoas que estejam em ramos que lhes interessem de forma a receberem o melhor aconselhamento possível”, refere.
Diogo Figueiredo partilha de uma opinião semelhante, pois, segundo o mesmo, “cada um escreve a sua própria história, pressupõe-se que se andas num curso superior tens de andar informado, tens de estar atento de tudo o que se passa à tua volta”. No entanto, a ser implementada alguma medida para ajudar nesta preparação o estudante diz já ter pensado numa rede de mentores. ”Já pensei numa rede de mentores, não sei se era um projeto a ir para a frente, não sei se era algo viável em Portugal, nem sei se já esta implementado em algum lado, mas um grupo de ex-alunos ou já empregados que se reunia em cada faculdade e falava com os alunos, uma coisa anual em cada faculdade, para partilhar ideias sobre o mercado de trabalhos e as dificuldades que vão enfrentar, seria um projeto bastante interessante a meu ver”.
“Eu acredito que existe uma triangulação entre escolas-jovens-empresas, onde cada um deve saber formar e saber receber essa formação: por exemplo, as escolas precisam de preparar os alunos para as empresas, como as empresas precisam de saber receber esses licenciados, seja no momento em que se integram nos quadros da empresa, ou na forma como damos o “não” a um candidato à vaga”, diz João Ribeiro que acrescenta ainda o que, na sua opinião, deveria ser mais explorado por parte das escolas “a realização de workshops, visitas a empresas, conferências, projetos internos aliciantes e modernos”, algo que no entanto, “não deve ser apenas feito no final do curso, mas em todo o seu programa”.
Para o professor Pedro Coutinho “há um desfasamento claro do modelo escolar, em relação aquilo que é o século XXI. Nós continuamos a usar o modelo educativo industrial, em que preparamos as pessoas para fazerem parte de uma linha de montagem, estão sentados e alguém inculca ideias ali”, apesar disto têm sido feitas mudanças muito positivas para alterar esta situação, “a questão é que muitas vezes os alunos não vêm equipados para essa mudança, estão habituados a sentar-se e a receber”. O docente realça ainda que “as escolas preparam de forma bastante clara para o que existe mas o que existe precisa de ser melhorado”, no caso do campo jornalístico revela que “as escolas conseguem formar jornalistas capazes de fazer o jornalismo que está a ser feito, o problema é que o jornalismo que está a ser feito já não chega”, para combater isso é necessário que os alunos que entram no ensino superior sejam ainda melhores e isso é algo que vai potenciar as Universidades pois estas têm os mecanismos necessários para isso, e “nessa altura sim, as escolas podem fazer a mudança”.
Fase das dificuldades
As dificuldades vão sempre aparecer, mas não é por saber que elas existem que o medo diminui.
Para a finalista Carina Veloso, a maior dificuldade que pensa que vai encontrar “vai ser aprender a ir de encontro à forma como cada um dos meus colegas trabalha, e a forma como me posso dirigir a cada um deles. Por incrível que pareça, o contacto com as pessoas e o saber interagir com elas é algo complexo pois as pessoas são todas diferentes! A nível de conteúdo também… parece sempre que a informação que temos connosco não é a suficiente para conseguir trabalhar, parece que não sabemos fazer nada. Mas isso por vezes são só as inseguranças a vir ao de cima. Temos que nos manter abertos à aprendizagem”.
Para aqueles que vão continuar o percurso académico, nomeadamente para Mestrado, estas dificuldades não são algo que gere preocupação neste momento, como é o caso de Frederico Garcia. “Quanto a dificuldades, não tenho pensado muito nisso, uma vez que a minha entrada no mercado de trabalho não será para já”, no entanto, na sua opinião, a maior dificuldade que irá encontrar será a concorrência , “tendo em conta a minha área de estudos, será a concorrência a maior dificuldade, no sentido de postos de trabalho, mesmo sendo uma área hoje muito procurada e abordada, há imensa concorrência a nível de postos de trabalho e elevada dificuldade de encontrar trabalho nesta área em Portugal, daí haver tanta concorrência”.
Apesar de ainda estar no segundo ano de licenciatura, Luís Madeira, revela já ter uma ideia dos obstáculos que vai encontrar, no entanto diz que “não é fácil estar agora a especular quais é que vão ser as dificuldades, porque é algo vai depender muito do estado das coisas daqui por um ano”. Na sua opinião, a melhor forma de neste momento se preparar para as dificuldades é “falar com pessoas que já trabalham na área e passaram por dificuldades que eu, provavelmente, também vou encontrar”.
Na opinião de Mariana Ribeiro as maiores dificuldades que um recém-licenciado encontra são “a precariedade e a falta de condições no trabalho”, nomeadamente propostas de trabalho sem contrato e meses de experiência não remunerados.
As dificuldades vão sempre surgir, mas com elas surgem também momentos de aprendizagem e de reflexão. “Quem é bom tem sempre lugar em qualquer lado, e se não tiver lugar em qualquer lado também cria a sua própria oportunidade. O meu grande conselho passa sempre por isto, serem felizes com aquilo que estão a fazer”, remata o docente Pedro Coutinho.