Desalojados

José, Lara e Joana. Lisboa, Porto e Coimbra. A vida dos estudantes universitários não é fácil no que toca à procura de casa na altura de ir viver para outra cidade. Para além da especulação imobiliária e o consequente aumento dos valores das rendas, estes estudantes muitas vezes são deparados com más situações de habitação.

No que diz respeito a esta situação, não podemos negar que as cidades mais afetadas são Lisboa, Porto e Coimbra. Dados disponibilizados pela revista Visão em novembro de 2017, revelam que em média um quarto em Lisboa fica a 364€ por mês, e no Porto este valor desce até aos 272€ mensais. Porém, nesta última cidade, o preço médio subiu cerca de 40% em relação ao ano de 2016, onde o valor médio mensal era de 195€. Uma diferença que já pode pesar na carteira dos estudantes.

Ao saber desta situação e também da falta de condições de habitação vividas por alguns estudantes, a Federação Académica de Lisboa (FAL) realizou o estudo “Alojamentos de Estudantes Deslocados – Residências e Arrendamentos” que faz parte do “Livro Negro do Ensino Superior”, publicado em abril de 2018. A principal conclusão que se pode tirar do estudo é que 64% dos alunos não estão minimamente satisfeitos com o seu alojamento. Este estudo foi feito, mais especificamente, às condições das residências universitárias de Lisboa, na qual cerca de 50% dos estudantes dizem pagar mais de 150€ mensais. Estas residências nem sempre têm as melhores condições, havendo casos em que só existe um fogão disponível para 50 alunos. Contudo, a situação piora para quem não conseguiu lugar numa residência universitária e teve que optar por arrendar um quarto. Em entrevista à Lusa, João Rodrigues, presidente da FAL, revela que “há alunos a pagar 430€ para viver numas águas furtadas”, ou então situações em que a utilização da cozinha tem um custo à parte do valor mensal.

José Pereira está a estudar Direito na Universidade de Lisboa e apesar de ser o segundo ano do curso, a casa onde este habita atualmente já é a terceira. José conta que teve bastantes dificuldades a encontrar um quarto disponível: “A primeira dificuldade que senti foi arranjar efetivamente um quarto disponível, ou seja, maior parte dos anúncios de quartos já estavam ocupados.” Como o próprio refere, em Lisboa não existem quartos de valor inferior a 200€, assim sendo os quartos mais baratos (entre 200€ e 300€) eram logo ocupados. A única opção era optar por um quarto mais caro, cerca de 350€ por mês, valor que os seus pais não conseguiam suportam.

Todavia, as dificuldades económicas não eram o único entrave, “A segunda dificuldade foi arranjar um quarto para um rapaz, já que a maior parte dos senhorios preferem arrendar o quarto a raparigas. Desta forma, a maioria dos quartos eram impossíveis de serem para mim.” Apesar destas situações, José conseguiu arranjar um quarto por 250€ mensalmente, valor que apesar de considerar elevado diz que não é muito excessivo tendo em conta que está em Lisboa. O estudante diz ainda que “Na casa onde estou não me posso queixar absolutamente de nada! Das três casas onde estive esta é, indubitavelmente, a que tem melhores condições de habitação”.

Se nos dirigirmos mais para o Norte, concretamente a cidade do Porto, constatamos que a situação vivida pelos estudantes universitários também não é fácil. Apesar das rendas serem mais baratas comparativamente a Lisboa, os valores mensais continuam a subir de ano para ano.

Quem melhor sente essa dificuldade é Lara Moreira, estudante de Geografia na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, que conta que no início foi bastante difícil arranjar um quarto nesta cidade: “Não conhecia nada e a especulação fundiária no Porto leva a um grande aumento dos preços. Perto das faculdades é bastante difícil encontrar quartos abaixo dos 250€”.

Apesar desta realidade que retrata, Lara conseguiu arranjar um quarto por 145€ mensais, um valor que não considera elevado tendo em conta a sua excelente localização. Contudo, como acontece nestes casos, a casa não tem as melhores condições como a estudante relata: “A casa é muito antiga, as janelas deixam entrar muito frio e uma das casas de banho não se encontra em bom estado para ser usada, sendo que moram cinco pessoas e só há uma casa de banho disponível.” Como se não bastasse, Lara tem ainda problemas com o seu senhorio, pois este não se interessa em resolver os problemas da casa e além disso não passa recibos.

Esta é uma realidade presente em muitas situações de aluguer de quartos a estudantes, como diz João Rodrigues, “A maioria dos senhorios não passa recibo e quando as famílias o pedem as rendas aumentam ainda mais”. Todavia, apesar destas situações pouco favoráveis, quando questionada sobre a possibilidade de mudar de casa, Lara foi bastante assertiva: “Não. Estou numa localização muito boa para o preço que pago. É impossível pagar o mesmo por outro quarto com melhores condições”.

Coimbra. Uma cidade cheia de história, tradição, e claro, vida noturna. Por estes motivos, para muitos estudantes é a cidade escolhida para estudar. Joana Costa estuda Turismo, Território e Patrimónios na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, e em semelhança a José e Lara, também ela teve dificuldades em arranjar um sítio para ficar: “Tive um pouco de dificuldades visto que Coimbra é uma cidade de estudantes e normalmente a malta quer algo novo, a bom preço e perto da faculdade.” Contudo, quando falamos de valores mensais de renda, a situação em Coimbra é mais positiva do que nas outras cidades.

Segundo um estudo realizado pelo idealista, em agosto de 2017, Coimbra teve um aumento de 6% no valor mensal, face a agosto de 2016. Joana já chegou a pagar 200€ e até 100€ com as despesas incluídas, e considera que não é um valor elevado tendo em conta as condições de alojamento que tinha. Porém, a estudante afirma que “mais de 200€ por quarto já é caro. No entanto, Coimbra está agora com muita procura e os preços subiram em média 50€.”

Não são só os estudantes destas grandes cidades que têm problemas com o alojamento. A situação vivida no resto do país também não é a mais animadora. O Notícias de Coimbra avança que os principais distritos do país sofreram aumentos. Lisboa, como já referido, continua a cidade mais cara, porém foi o Porto que sofreu um maior aumento. A seguir, quem se destaca é a cidade de Aveiro, onde a variação de preço foi de 25%. Segundo o mesmo jornal, os estudantes desta cidade pagavam 157€, em 2017, passando agora a pagar 196€. Outra cidade que também registou um aumento considerável foi Braga. Em 2017, um estudante poderia pagar 210€, mas agora este valor médio mensal já subiu até aos 250€.

 

Muita procura e pouca oferta

Mas afinal porque é que os preços das rendas estão a subir de ano para ano? É fácil de explicar: existe muita procura para pouca oferta. Há cada vez mais pessoas a procurar na internet quartos para poderem habitar enquanto estão longe da sua cidade. Outro dado a apontar é o facto de Portugal ter vindo a receber, ao longo destes últimos anos, mais estudantes estrangeiros. Isto significa mais pessoas a procurar o mesmo e a ser cada vez mais difícil de encontrar. De acordo com dados da Direção – Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, em 2016, o número de estudantes estrangeiros rondava os 42.500, o que significa uma subida de 48% em relação a 2011. Portugal está na moda, e parece que esta moda veio para ficar.

Os turistas não nos procuram só pelo turismo, mas também pelas nossas universidades, que estão cada vez mais conceituadas fora do país, e claro, pelo custo de vida mais acessível. Mas os estudantes estrangeiros não são o único problema. Existe uma grande escassez de residências universitárias públicas e privadas. Aquelas que existem só cobrem 2% das necessidades dos estudantes.

Esta é a realidade vivida pelos estudantes portugueses. Sem ter outra solução, muitos deles acabam por não ir para a universidade, outros preferem ir a casa todos os dias, gastando horas do seu dia com as viagens, e ainda há aqueles que, contrariando todos os problemas, resolvem ficar. Estes são obrigados a submeterem-se a condições, muitas das vezes, desumanas, preferindo suportá-las, guiados pelo sonho de um dia terem uma vida melhor.

 

Reportagem: Mariana Silva

Imagens: DR

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