Furo de indignação

A 30 de setembro de 2015, o Estado e a empresa Australis Oil & Gás assinaram uma pesquisa e produção de petróleo desde Peniche até à Figueira da Foz. Em 2018, a empresa australiana comprou um terreno na Bajouca, Leiria, para realizar uma prospeção de gás, prevista para 2019, o que deixou a população indignada.

“Poluição na nossa terra NÃO!”, é o que realça o cartaz que está em frente ao terreno escolhido pela Australis Oil & Gás para a prospeção de gás na Bajouca.

Um dos cartazes que está em frente ao terreno

Jairo Dias soube da petrolífera através de uma publicação nas redes sociais da Junta de Freguesia da Bajouca. Após  falar com algumas pessoas e perceber que ninguém tinha conhecimento do caso decidiu criar uma página no Facebook para falar sobre o assunto e organizou uma reunião, em conjunto com a junta de freguesia, para esclarecimento de dúvidas.

Jairo é contra a prospeção de gás na sua terra. “Acho, que embora, todos precisemos de combustíveis fósseis, o local que foi escolhido na zona da Bajouca não será o mais apropriado uma vez que estamos no meio das povoações. E, como se sabe, as construções petrolíferas trazem sempre alguns riscos seja para a água ou para o ar de quem vive aqui ao lado”.

A maioria da população está contra a prospeção de gás, mas há algumas pessoas que consideram que vai ser bom para a região. No entender de Jairo, essas pessoas “ estão muito mal informadas e não têm a real noção do que isto envolve para a região centro. Eu conheço aí um ou dois que estão aí caladinhos que supostamente estão sempre envolvidas, mas agora desconfio que estão interessados porque têm máquinas”.

Relativamente a benefícios da construção da petrolífera, Jairo considera que não vai trazer nada de bom. “Tanto quanto sei não vão haver nenhuns, embora eles digam que vão dar dinheiro às autarquias, mas não se sabe nada em concreto”.

Após algumas pesquisas, Jairo concluiu que “pelo que se sabe pelos contratos, o combustível não vai ser vendido em Portugal. Eles até o podem vender cá, mas só se quiserem perder dinheiro”.

“Portugal vai ter de continuar a comprar fora. Aliás, eles vão enviá-lo para o mercado internacional e vendem lá  e Portugal continua a comprar ao mesmo preço. O gás igual. Eles falam que temos reserva para vários anos de gás, mas não. Os portugueses não vão ver este gás. Porque há contratos e temos de o comprar na mesma. Portanto, vão ter de continuar a importar gás, para já nos próximos anos”, informa Jairo Dias.

Pedro Pedrosa, presidente da Junta de Freguesia da Bajouca, foi convidado pela empresa Australis para ir a uma apresentação de prospeção de gás na zona centro. “A junta teve conhecimento numa apresentação no Hotel Eurosol no dia 31 de outubro, e foi aí que tivemos conhecimento que era propriamente num sítio da Bajouca”.

 

Presença de hidrocarbonetos

A empresa Australis refere, no contrato, que a Bajouca foi o local escolhido após se ter descoberto a presença de hidrocarbonetos. “A justificação para a execução deste projeto assenta na intenção de pesquisar a presença de Gás Natural no subsolo da Bacia Lusitânia de Portugal, na área de concessão de Pombal, freguesia de Bajouca, concelho de Leira”.

“Segundo o proponente, os resultados de prévias campanhas sísmicas 2D e 3D e de algumas sondagens locais revelaram a presença de hidrocarbonetos”, é o que se pode ler no contrato.  Sendo que “o projeto ocupa uma área de 0,6 hectares”.

A empresa australiana refere que “o trabalho proposto para a concessão de Pombal, consiste na execução de uma sondagem de um poço vertical, no ano de 2019, com o objetivo de atingir a formação de Silves, a uma profundidade de aproximadamente 4.350 metros, para testar a formação de Lemede para produção de gás natural”.

Também a junta de freguesia é contra a construção de uma petrolífera.  “A junta aprovou uma moção, ou o executivo da junta, propôs uma moção contra a exploração de gás. Prospeção ou exploração, vamos esperar para ver. A junta não tem poder para dizer se pode fazer ou não, porque os senhores lá do governo, há quatro anos antes das últimas eleições lembraram-se de assinar isso”, afirmou Pedro Pedrosa.

Pedro Pedrosa, presidente da Junta de Freguesia da Bajouca

O contrato que a Australis Oil & Gás assinou para já é de prospeção de gás. “O que está aqui em causa é um furo para ver se há gás ou não. Se houver gás que dê para explorar, há outras regras que eles têm de cumprir. Têm de começar o processo do zero, outra vez”, referiu o autarca.

“Ainda a semana passada alguém me disse que já foram feitos mais de 50 furos desta natureza e nenhum deu gás. Portanto, às vezes, isto também é  mais o alarido porque é na nossa casa, porque se fosse na casa do vizinho não nos importávamos”, relativiza Pedro Pedrosa.

A Câmara Municipal de Leiria está a elaborar um Estudo de Impacto Ambiental e só se vai pronunciar após o lançamento da mesma. “A Câmara Municipal de Leiria em conjunto com o PSD Leiria fez uma moção contra o fracking na nossa zona. Portanto, não sei o que é que a Câmara poderá fazer mais para agora”, reagiu o presidente da junta.

Edite Rodrigues, de 36 anos, natural da Bajouca, é uma das habitantes que não concorda com o avançar da prospeção de gás. “Não concordo por várias razões. Por questões económicas, acho que somos uma região com um elevado nível turístico e isso não vai beneficiar em nada e a nível ambiental acho que é uma indústria poluidora”.

João Domingues, tem 46 anos, e também é natural da Bajouca, e é da opinião de que a exploração de gás não vai ser benéfica para a região. “Eu sou totalmente contra. Não vai trazer benefícios e acho que não devíamos deixar isso ir para a frente. A população deve recorrer aos meios dentro da legalidade para não avançar”.

Outro cartaz que está em frente ao terreno

 

“Há quem diga que eu sou o culpado por ter vendido o terreno”

Luís Agostinho Soares era o proprietário do terreno no qual vai ser feita a prospeção. Após um ano de negociações, a venda do terreno foi realizada a meio do ano de 2018. “O terreno já estava à venda há quatro anos. Há quem diga que eu sou o culpado por ter vendido o terreno. Se eu não vendesse, alguém venderia, porque estava um ao lado, inclusive, que não foi vendido porque não quiseram comprar”, referiu o antigo proprietário.

Quando concluiu a venda não sabia para que fins seriam. Em relação à exploração de gás “acho mal, segundo dizem como é. Se é prejudicial acho mal”.

Altina Rodrigues, é engenheira ambiental, e explica como se realiza uma prospeção de gás. “ Numa fase inicial recorrem a estudos sísmicos e outras técnicas geofísicas e ou geológicas para identificar potenciais localizações. Em seguida podem realizar furos para analisar mais detalhadamente as características do solo e afinar a localização e a dimensão do reservatório”.

Como já está confirmado que há gás, “na fase de prospeção vão procurar conhecer as características do reservatório e a quantidade de gás efetiva, para avaliar se é técnica e financeiramente viável a exploração”, refere Altina.

Numa exploração petrolífera há cinco fases: prospeção, avaliação, desenvolvimento do projeto, exploração e, por último, abandono ou reativação.

Segundo Altina, “neste momento estamos perante a fase de prospeção. Se os resultados indiciarem boas perspetivas para a viabilidade da exploração, irão avançar para a avaliação ( em que vão refinar os estudos, os testes de produção e vão delinear o projeto). Apenas após esta fase vão avançar para o desenvolvimento do projeto e subsequente exploração. Tudo isto dependerá da quantidade de gás, da qualidade do reservatório e das condições possíveis de exploração”.

A engenheira ambiental refere que só os estudos de avaliação de impacte ambiental poderão indicar se a prospeção de gás irá trazer consequências para a localidade. “Depende do que será feito, como será feito, com que objetivo será feito. De qualquer forma, como acontece em qualquer projeto, em qualquer local do mundo, haverá sempre impacto na envolvente, no entanto, o impacto, para além de ser de diferentes índoles, pode ser positivo, negativo ou nulo, significativo ou não significativo”, refere Altina Rodrigues.

Relativamente, aos benefícios da prospeção de gás, Altina garante que há vários. “Naturalmente que sim. Basta olhar em redor e ver que usamos sistemas de aquecimento a gás natural, produzimos eletricidade em centrais térmicas alimentadas a gás natural. Como imagina, este gás que usamos foi extraído numa terra qualquer, que mesmo não se chamando Bajouca, teria uma comunidade envolvente”, refere a engenheira ambiental.

“O processo de prospeção é necessário para a avaliação da viabilidade do negócio. O processo de exploração é necessário para a efetivação do negócio. Vamos supor que este gás serve para produzir eletricidade e que essa eletricidade vai substituir outra fonte fóssil de energia mais poluente. Nesse caso, teria um impacto positivo”, conclui Altina Rodrigues.

O jornal Sábado referiu, no dia 11 de janeiro deste ano, que a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) exige que sejam realizados Estudos de Impacte Ambiental completos às sondagens de prospeção e pesquisa de petróleo em Pombal e na Batalha. Para a APA, os contratos têm “várias lacunas, tanto de carácter global como de carácter específico ao nível dos vários fatores ambientais, e é necessária uma nova consulta pública alargada”.

As duas zonas previstas para em 2019 extraírem gás (Bajouca e Batalha)

O jornal indica, ainda, que no estudo de impacte ambiental realizado, pela Australis, para a prospeção de gás na zona de Pombal há várias lacunas como “falhas e algum descuido que parecem resultar de uma deficiente tradução de documentos técnicos em língua inglesa”. Bem como, a falta  de identificação de linhas de água na área onde o projeto será implementado, ou o texto “pouco esclarecedor” no que toca às mudanças na paisagem, entre outras imprecisões.

No final do ano de 2018, a Câmara Municipal de Pombal aprovou por maioria, numa Assembleia Municipal, uma medida contra “o desenvolvimento de trabalhos de prospeção de hidrocarbonetos prevista para a região, no âmbito da concessão atribuída à Australis Oil & Gás”.

Jairo Dias mostra-se com esperanças que a prospeção não avance. “No dia 21 de dezembro, na Assembleia da República, três propostas do Bloco de Esquerda, PAN e Verdes foram debatidas, sendo que a proposta dos Verdes foi aprovada, que é uma recomendação para o cancelamento destes contratos”.

A pedido da Junta de Freguesia da Bajouca, a Australis Oil & Gás no dia 29 de janeiro realizou-se uma sessão de esclarecimento na A.B.A.D. Pisão.

 

Reportagem: Carolina Dias

Imagens: DR

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