O aumento dos preços: desafios na compra de alimentos despertam preocupações

Nos corredores dos mercados, desdobra-se um fenómeno que afeta diretamente milhões de pessoas.

Reportagem de Daniela Costa

Nos últimos anos, o aumento constante dos preços dos alimentos tornou- se uma realidade inegável, conduzindo a grandes mudanças significativas nos hábitos de consumo e diminuindo o poder de compra dos consumidores. Este fenómeno, impulsionado por diversos fatores, não só afeta os grandes supermercados como se reflete diretamente nos orçamentos dos cidadãos e nas estratégias de negócio dos comerciantes locais.

A pandemia do covid-19 e a guerra da Ucrânia são fatores que influenciaram a subida dos preços, nos últimos anos. Mas como é que realmente os preços dos alimentos mudaram?

Uma análise feita pela DECO PROTeste indicou o aumento do preço de um cabaz de bens alimentares essenciais nos anos de 2022, 2023 e na primeira semana de 2024. O preço deste cabaz, composto por 63 itens, foi calculado todas as quartas-feiras, com base nos principais supermercados portugueses. O gráfico a seguir foi elaborado com base nesta análise. Cada mês tem o último preço do mês disponível no estudo. O preço do cabaz a 3 de janeiro de 2024 foi de 236,04€, o que mostra um aumento de 6€ da última análise de dezembro de 2023, sendo o mais caro desde janeiro de 2022. Antes deste valor, março de 2023 foi o maior preço registado com 234,84€, ainda cerca de 2€ a menos do que o cabaz da primeira semana do novo ano.

Preço do cabaz de bens alimentares essenciais em todos os meses de 2022 e 2023 e na primeira semana de 2024 baseado na análise da DECO PROTeste

O azeite virgem extra foi o produto cujo preço mais subiu entre dezembro de 2023 e janeiro de 2024, com um aumento de 1,62€, que corresponde a 17%. O carapau e o arroz carolino foram os seguintes produtos, com um aumento de 14 e 13%, respetivamente. No entanto, em apenas um ano (de 4 de janeiro de 2023 a 3 de janeiro de 2024), o segundo e terceiro lugar de produtos alteram, mas o azeite virgem extra continua em primeiro lugar com um aumento significativo de 87%.

A DECO PROTeste justifica o aumento do preço dos alimentos com a invasão da Rússia à Ucrânia, devido à maioria dos cereais consumidos na União Europeia, incluindo Portugal, serem provenientes do país beligerante, a Ucrânia. O setor agroalimentar foi, então, afetado, deteriorando para um estado ainda pior do que já estava. Em 2022, a taxa de inflação também aumentou, o que contribui para este cenário, apesar de no ano seguinte ter abrandado.

A visão de pequenos comerciantes: desafios e soluções

Para Elisabete Sousa, coproprietária do mercado de pequeno comércio “Sabor Próprio”, em Viseu, os preços, especialmente de frutas, legumes e outros produtos essenciais subiram significamente durante a guerra na Ucrânia. “Não fui muito afetada porque o valor da faturação tem aumentado a cada ano, porém se os preços não tivessem subido tanto, talvez tivesse um nível de faturação maior, mas é uma especulação, nunca vou saber”, pondera. Apesar do negócio só ter 4 anos, Elisabete Sousa sentiu mudanças consideráveis, devido aos desafios derivados da pandemia covid-19, logo a seguir a abrir e o início da guerra na Ucrânia, de seguida.

Quando confrontados com as adversidades que a subida dos preços trouxe, os proprietários do “Sabor Próprio” usaram várias estratégias para não “fechar as portas”. Estas incluem a aquisição direta de alguns produtos das produtoras locais, a produção própria de alguns itens e a procura e atenção por promoções ao adquirir, para poderem também eles próprios ter promoções na loja com o objetivo de atrair mais clientes. “Inicialmente eu comecei com frutas, legumes e produtos tradicionais, não era nada disto. Não tinha detergentes nem mercearia, por exemplo”, lamenta Elisabete Sousa.

Elisabete Sousa teve de alterar a estrutura do seu negócio para a sua sobrevivência

Alguns produtos duplicaram de preço, quando iniciou a guerra e então comerciantes como Elisabete Sousa viram-se forçados a adaptar-se diante dos desafios impostos pelos aumentos nos preços dos alimentos para se conseguirem manter à tona.

O impacto nos consumidores comuns

A realidade atual de muitos consumidores é que a subida constante dos preços não só impacta a regularidade das compras, mas também provoca uma alteração nos hábitos de consumo. Os cidadãos têm de ter uma maior atenção às promoções e aos preços no geral e sofrem uma redução na variedade dos produtos que adquirem. O dinheiro é gasto mais rapidamente e em menos coisas. “Sinto que acabo por deixar muito mais da minha mesada nas compras do que antes”, repara Diogo Ferreira, um estudante deslocado que deu o seu testemunho.

Frutas e azeite são os produtos em que o estudante sentiu mais os aumentos

A necessidade de priorizar despesas essenciais, como os alimentos considerados para o cabaz analisado pelo DECO PROTeste, coloca em cheque a capacidade das famílias de incluir itens agora considerados luxuosos, tais como refrigerantes e condimentos.

A análise feita a um cabaz com sete produtos não considerados essenciais de três supermercados principais em Portugal comprovou que para satisfazer certos prazeres ou confortos, teria um adicional custo de cerca de 30€. Este valor depende imenso devido à variedade de produtos não essenciais que existe.

Tabela de preços de três supermercados principais sobre sete produtos considerados não essenciais

Esta subida transcende o aspeto puramente económico. É uma situação que impacta a vida quotidiana, os hábitos de consumo e a resiliência dos empreendedores e consumidores. O maior desafio será perceber como sobreviver e navegar por estas águas turbulentas e, consequentemente, enfrentar o futuro incerto que se apresenta.

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