Universitários preocupados com o rumo político do país

Numa época em que assistimos a uma grande crise política, são cada vez mais os estudantes que se preocupam com o futuro do país. Apesar de assim ser, também são cada vez mais os estudantes descontentes com o rumo político que Portugal toma.

Reportagem de Maria Soares

Joana Gesteiro, estudante do terceiro ano de Sociologia no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, considera que apesar da grande quantidade de partidos nas eleições políticas, são poucos os que demonstram preocupações com o ensino dos estudantes universitários.

“A cada eleição que vamos assistindo, podemos reparar que são sempre criados novos partidos, mas ainda que assim seja, nenhum partido representa os direitos dos estudantes em condições. A quantidade nem sempre demonstra qualidade”, refere a aluna de sociologia.

À semelhança de Joana Gesteiro, Afonso Amaral, estudante do terceiro ano de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, conta que uma das suas preocupações “passa pelas conquistas ameaçadas pela dissolução do parlamento, causada pelo chumbo do orçamento em 2021, sendo que vários diplomas, como o projeto que pretendia alterar o luto parental para 20 dias, as alterações à lei laboral, o pacote anticorrupção ou o diploma acerca da aplicação da identidade de género nas escolas poderão cair por terra, já que a discussão terá agora de ser retomada na próxima legislatura”.

Afonso Amaral acrescenta ainda que são poucos os políticos que falam para os estudantes e pelos estudantes, mas tem na confiança na pequena parcela de políticos que retratam os direitos dos jovens e que se preocupam com os mesmos.

Preocupada com o futuro político do país, Bárbara Brito, estudante do terceiro ano de Administração Pública da Universidade de Aveiro, acredita que os políticos portugueses deviam ter uma maior preocupação com a qualidade do ensino e de vida dos estudantes, uma vez que são eles que vão contribuir para o país mais tarde.

“Nós queremos usufruir do ensino superior, queremos tirar um curso pois só assim é que podemos arranjar um bom emprego e ter uma vida estável, no entanto somos obrigados a depender dos nossos pais porque temos de pagar quase 700 euros de propinas todos os anos letivos e temos de pagar as rendas absurdas por um quarto ou apartamento com condições quase sempre terríveis”, explica Bárbara Brito.

A estudante de Administração Pública acrescenta ainda que existem muitos pais que não têm condições para pagar as propinas da licenciatura e a renda de um apartamento noutra cidade e, portanto, os filhos vêm-se obrigados a seguir áreas que não queriam seguir originalmente, limitados pela escolha de cursos que existem na própria cidade.

Debates não elucidam

No passado dia 30 de janeiro de 2022 decorreram as eleições para constituir a XV Legislatura da Assembleia da República. Quando se fala de eleições fala-se também em debates políticos, que na última campanha tiveram uma duração de 25 minutos cada um, cujo objetivo é elucidar a população acerca das propostas de cada político e das soluções que estes têm para dar ao país. No entanto, a opinião dos estudantes é diferente. Na perspetiva dos jovens universitários, os debates políticos não elucidam a população sobre o que cada partido político tem para oferecer ao país.

“Naturalmente não se esperaria que em 12 minutos um candidato conseguisse expor o programa eleitoral, mas o facto de não se ouvir sequer falar das propostas, comprova que estes debates não têm como objetivo ser informativos ou elucidativos”, refere Afonso Amaral.

Deste modo, o estudante explica que seria essencial a existência de ”sondagens pré-debates”, de maneira a aferir quais as preocupações dos portugueses, uma vez que os partidos não têm tempo suficiente para apresentar o seu programa eleitoral através dos debates. Afonso Amaral acrescenta que apesar do curto tempo que têm para apresentar soluções, os políticos não fazem referência a temas essenciais, “como a habitação pública e social, as políticas contra o racismo e discurso de ódio, as alterações climáticas, a precariedade laboral, a ferrovia e transportes públicos, a violência de género, entre outros”.

Para além disso, Tânia Maneta, aluna do terceiro ano de Educação Social da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Politécnico de Leiria, considera que os debates políticos são, por vezes, de difícil compreensão, uma vez que os políticos se expressam com um vocabulário complexo, o que se traduz numa falta de entendimento dos assuntos tratados por parte da maioria da população portuguesa.

Rui Gabriel, estudante de Educação Social na mesma instituição, acrescenta que grande parte dos portugueses não está dentro dos assuntos da política nem percebe muito sobre a temática e, portanto, seria uma mais valia a utilização de um vocabulário mais simples e menos técnico na explicação do programa eleitoral de cada candidato. “Retiro sempre algumas informações dos debates políticos, no entanto, tendo em conta o meu pouco conhecimento acerca de política, reconheço que muita da informação não me é percetível”, explica o universitário.

Outra preocupação que atinge os estudantes é a falta de tempo que os portugueses têm para analisarem, com atenção, os programas eleitorais e os debates políticos para então, votar de forma consciente.

“Se formos ler os programas eleitorais de todos os partidos, daria um total de 1696 páginas, o que é um absurdo. A época das eleições coincidiu com a época de exames dos estudantes universitários, era impossível ler e conhecer realmente os partidos à disposição, sem falar que cada debate tem 25 minutos e a maioria dos estudantes não os consegue ver do inicio ao fim, vamos apanhando partes e vamos estruturando uma opinião através de excertos que vamos vendo ao longo da semana de campanha ou do que vamos ouvindo de familiares e, infelizmente, é o que acontece com a maioria de nós”, expõe Bárbara Brito.

Ascensão da extrema-direita

Porém, as preocupações dos jovens universitários não acabam por aqui. Joana Gesteiro destaca a situação que mais a preocupa na política em Portugal – a ascensão da extrema-direita. André Ventura, líder do partido Chega, conotado com a extrema-direita, continua a ganhar terreno em Portugal, de forma significativa. Nas eleições legislativas, que ocorreram em outubro de 2019, o partido obteve 1.29% dos votos, conseguindo eleger pela primeira vez um deputado na Assembleia. Já nas eleições presidenciais, em janeiro de 2021, André Ventura conseguiu 12% dos votos e, nas eleições legislativas que decorreram no passado dia 30 de janeiro, obteve 7,15% dos votos, elegendo 12 deputados na Assembleia da República.

A estudante acrescenta que é preocupante um partido de extrema-direita conseguir ficar colocado em terceiro lugar nas eleições para a nova legislatura, alcançando a oportunidade de eleger 12 deputados para a Assembleia. “A falta de tempo das pessoas para se informarem, verdadeiramente, sobre o programa eleitoral de cada partido, traduz-se na ascensão dos partidos de extrema, como foi o caso do CHEGA, um partido de extrema-direita, que conseguiu ficar em terceiro nas eleições de janeiro”, explica Joana Gesteiro.

Esta não é uma preocupação apenas de Joana Gesteiro. Bárbara Brito, considera igualmente preocupante o poder que o CHEGA ganhou na última eleição, referindo a existência de uma grande falta de consciência por parte da população que vota em partidos de extrema. “É muito preocupante, sobretudo para nós estudantes que vamos aprendendo, ao longo da vida, sobre a história de Salazar, de Hitler, de Mussolini, no fundo das grandes figuras políticas do fascismo, e percebermos que em pleno século XXI a história poderá voltar a repetir-se. E tudo indica para isso, uma vez que desde o 25 de abril que não se vê um partido de extrema-direita ganhar tanta força como o CHEGA ganhou nos últimos anos”, desabafa Bárbara Brito.

São cada vez mais os estudantes que dão importância ao papel dos políticos em Portugal e à falta de consciência por parte da população. Os jovens universitários começam a ficar preocupados com o seu futuro e com o futuro do país, uma vez que partidos como o CHEGA ganham, cada vez mais, poder em Portugal e influência nas pessoas.

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